sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Crítica: Deixe-me Entrar


Direção: Matt Reeves
Gênero: Suspense/Terror
Duração: 115 min.
Ano: 2010

“Espetacular!”
(The Independent)

“Excepcional!”
(Time Out)

Uma demonstração de vampirismo promissora

Nos últimos anos, temos visto a cultura pop reciclar certos temas de forma bastante apelativa, direcionando-os a um público mais jovem, ainda que isto soe predominantemente como um pleonasmo. Isto foi o que aconteceu, por exemplo, com os vampiros, que, de monstros góticos e seculares ganharam nova roupagem – nem sempre bem aceita –, tornando-se ícones adolescentes. Aproveitando essa onda de “ressurreição” dos bebedores de sangue, aliada à falta de originalidade generalizada que assola Hollywood, o diretor Matt Reeves (realizador do considerável sucesso “Cloverfield: Monstro”) apresenta mais um remake para o rol da temática vampiresca, já tão desgastada. Contudo, “Deixe-me Entrar” (Let Me In) difere agradavelmente da maioria das produções atuais do gênero ao trazer uma abordagem séria e crua ao assunto, resgatando conceitos essenciais do mesmo, ao tempo em que inova na própria estrutura e rumos da história.
“Deixe-me Entrar”, refilmagem americana do cultuado filme sueco “Lat den rätte komma in”, apresenta uma proposta ousada na narração da trama, uma vez que os protagonistas são crianças – e uma delas é vampira. A inovação do filme, entretanto, está na postura assumida: o distanciamento de infantilidades; não há pretensão de atenuar violência ou apresentar personagens rasos, por se tratar de crianças, mas, pelo contrário, determinados assuntos “adultos” são tratados com naturalidade no decorrer da projeção, sem maquiagem ou floreios visuais.
Girando em torno do garoto Owen (Kodi Smit-McPhee, em uma interpretação espetacular), a história revela seu cotidiano difícil, principalmente por sofrer humilhações e bullying na escola; uma cena em especial, em que ele passa por um terrível constrangimento no banheiro é perturbadora o bastante para o espectador notar que evidentemente não está diante de um produto típico para o público infantil.
É em um desses momentos de revolta por tais humilhações que Owen conhece Abby (Chlöe Grace Moretz, a nova Carrie), uma garota mais ou menos da idade dele, que acabou de se mudar para o apartamento ao lado de sua casa. A partir de então, desenvolve-se uma relação razoavelmente amistosa entre eles, embora Owen estranhe os mistérios em torno de Abby, como sua insensibilidade ao frio e a intolerância à comida.
Chama a atenção o contraste construído pela história ao apresentar a vampira mirim Abby: nos momentos em que está com Owen, ela é melancólica, mas afável e o filme assume, nesses momentos, contornos de romance infantil, muito inocente; entretanto, nas situações em que Abby caça e ataca para se alimentar – e, a essa altura, já está claro que ela não aprecia coelhos ou esquilos – ela é selvagem e assustadora, garantindo as cenas mais sangrentas do filme. Este contraste, esta dualidade de personalidade conforme o instante é uma das melhores sacadas da obra, pois garante um equilíbrio entre as ações da personagem, afastando-a do clichê de ser politicamente correta e dando-lhe profundidade, multidimensionalidade.
Muito se fala que o filme original de 2008 é muito superior ao remake, mas, bem avaliado, isto não corresponde tanto à realidade, primeiro porque o filme de Reeves possui uma abordagem notavelmente distinta do filme sueco. Enquanto a película de Tomas Alfredson era baseada num livro homônimo, mais concentrado no drama e na sutileza psicológica, deixando o vampirismo quase em segundo plano, o novo filme busca um ponto de equilíbrio entre esses temas, dando, porém, ênfase à ação. Isto não significa que o roteiro da refilmagem deixa a desejar; não; nesta versão, conforme mencionado, a perspectiva é diferenciada e, embora a violência gráfica e a ação com toques de suspense policial sejam os principais atrativos, os demais aspectos do longa não decepcionam o espectador.
A transposição da história de Estocolmo para Novo México preservou as características básicas do filme original no plano visual (como, por exemplo, o cenário: uma cidade fria, onde está sempre nevando), enquanto Matt Reeves demonstrou habilidade em controlar o timing do filme, dando aos personagens mirins o tempo necessário, sem pressa ou atraso no desenvolvimento da história, para que a mesma não soasse artificial ou forçada.

Em resumo, “Deixe-me Entrar” é, com certeza, um dos melhores filmes de vampiros dos últimos anos, competindo apenas, provavelmente, com seu original a cujo nível dramático não chega, mas que também não pretende alcançar dessa forma. Reeves constrói um filme com identidade própria e, se podemos dizer que remakes são desnecessários, “Let me In” prova que ao menos podem ser satisfatórios quando bem feitos. 


Conceito: Ótimo
Nota: 9,0



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