Direção: Andrea Arnold
Gênero: Drama/Romance
Duração: 128 min.
Ano: 2011
“Audacioso, um
filme bárbaro”
( The Guardian)
“Brutal e comovente”
(Daily Telegraph)
“Glorioso”
(The Times)
Uma perspectiva crua e visceral do
romance clássico
Como grande parte
dos clássicos da literatura universal, a obra “Wuthering Heights”, da inglesa
Emily Brontë, tem longa carreira em versões para cinema e outras mídias.
Algumas dessas adaptações tiveram grande aceitação de público e crítica, como
foi o caso do filme de Peter Kosminsky, estrelado por Ralph Fiennes e Juliette
Binoche; outras, ou por não abordarem a obra em sua completude literária, ou
por dar preferência a uma perspectiva diferente da mesma obra (a fim de evitar
ser “mais do mesmo”), não ganham o merecido destaque e são até incompreendidas
pelos leitores mais rigorosos do livro. Nesta última categoria está o filme de
Andrea Arnold, a mais recente versão cinematográfica do romance de Brontë, que
possui uma abordagem notavelmente distinta – às vezes até gritante – da obra.
O filme narra a
história icônica da família Earnshaw, moradores do Morro dos Ventos Uivantes,
cujo patriarca, depois de uma longa viagem, traz consigo um garoto que achara
perdido, a quem batiza com o nome de Heathcliff. Já aqui duas considerações
ficam claras e intencionalmente diferentes do livro: primeiro, os Earnshaw não
são uma família rica, vivendo num simples casebre; segundo, Heathcliff é negro.
Chegando à casa, Heathcliff é, a princípio, hostilizado por Cathy, a filha
legítima do dono da casa; entretanto, com o tempo, à medida que Cathy se
aproxima de Heathcliff e começa a nascer um vínculo intenso entre eles, o irmão
mais velho dela apenas intensifica seu ódio pelo garoto, a quem vê como um
intruso na casa. Com a morte do dono da casa, Heathcliff passa a ser humilhado
e castigado constantemente por Hindley, ao mesmo tempo em que desenvolve um
sentimento de posse a mágoa em relação a Cathy, a quem ama, mas por quem é
abandonado quando ela aceita o pedido de casamento de Edgar Linton, um jovem
rico da região. Sentindo-se traído, Heathcliff foge do Morro dos Ventos
Uivantes, retornando apenas alguns anos depois, com dinheiro, sem saber direito
o que fazer, mas magnetizado pelo poder exercido sobre ele por Cathy.
Essencialmente, o
filme preserva a identidade da obra em que se baseia, embora tome liberdades
criativas que muitos espectadores desaprovam; não há aqui a retratação de
valores aristocráticos (não em destaque), mas uma visão visceral sobre as
diferenças entre “os mundos” dos protagonistas e seus anseios atemporais. Se,
por um lado, essa atitude de Arnold pode ser considerada ‘subversiva’ em
relação ao contexto do romance, por outro lado traz uma interessante inovação
ao mesmo, ao abordá-lo sob uma perspectiva mais realista. No caso da
representação de Heathcliff como negro, provavelmente a diretora quis ressaltar
que além da diferença de classe que o separava de Cathy, havia também a questão
racial, numa época em que imperava a rigidez vitoriana (a qual é até mencionada
por Hindley: “ele não é meu irmão; é só um negro!”).
Outro aspecto
crucial na abordagem de Andrea Arnold foi a ênfase na infância dos
protagonistas; mais da metade do filme retrata o desenvolvimento da relação
entre eles quando crianças ainda, das descobertas da amizade e do amor
reprimido aos sofrimentos e decepções, brigas e outros conflitos daquela fase.
De fato, as interpretações das crianças como os jovens Heathcliff e Catherine,
respectivamente, ficaram louváveis; ambos demonstraram uma química em cena
fantástica, sobretudo o menino carrancudo e malcriado. Para a fase adulta, James
Howson e Kaya Scodelario (em substituição a Natalie Portman) interpretam os
protagonistas, acentuando suas características ou transmutando-as conforme a
situação: Howson vive um Heathcliff amargo e magoado, mas que não hesita em ir
humilhar-se diante de Cathy, enquanto Kaya traduz em gestos simples, poucas
palavras e um olhar penetrante, todo o fascínio da mulher enigmática que
casou-se com outro, mas mantém ainda o seu amor ciumento e irracional por ele.
Falando em aspectos
técnicos, a escalação de um elenco desconhecido foi um grande acerto, já que
assim as performances ficaram transparentes, de modo que os atores não puderam
se “escorar” na fama eventual trazida por outros filmes dos quais poderiam ter
participado ou por prêmios que tenham ganhado.
A fotografia e o
figurino desta versão de “O Morro dos Ventos Uivantes” certamente enche os
olhos tanto dos leitores de Brontë quanto de qualquer outro espectador; com um
visual natural ao extremo, evidenciando a paisagem melancólica em que se passa
a história, Arnold faz questão de que o ambiente tenha participação crucial no
filme, fazendo com que o som do vento, a imagem de pássaros voando, o barulho
da chuva e até mesmo o silêncio tenham uma linguagem significativa própria que,
aliás, se sobrepõe à linguagem verbal com maestria na maior parte do filme.
Curiosamente, o filme não possui trilha sonora – exceto o tema, “The Enemy”, da
banda Mumford &Sons, que acompanha os créditos -, o que deixa a projeção
com um caráter semelhante ao de documentário, onde há até a câmera subjetiva
que acompanha e corre com os personagens, como se fosse um deles.
De fato, se “O
Morro dos Ventos Uivantes” possui falhas, elas não estão na liberdade criativa
de Andrea Arnold, mas em certas irregularidades de ritmo; como mencionado, mais
da metade do filme se concentra na infância de Heathcliff e Cathy. Isto serviu
para mostrar como a ligação entre eles foi gradativamente construída e
aprofundada, mas teve um reflexo negativo no final. Não houve tempo suficiente
para desenvolver melhor a relação entre os protagonistas adultos, o que é
lastimável, pois tanto Howson quanto Kaya tiveram interpretações marcantes,
embora muito reduzidas pela falta de um roteiro que lhes permitisse maior
envolvimento. Faltou aquela dose de romance que devia emergir no fim e deixar
as marcas tão conhecidas na literatura; não que não haja romance aqui também,
mas é que ficou tudo tão rápido que temos a impressão de que a diretora, depois
do ritmo lento do início, tinha pressa em acabar logo o filme.
Conceito: Muito Bom
Nota: 8,0
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