quinta-feira, 21 de junho de 2012

Crítica: O Silêncio dos Inocentes

     



Jonathan Demme apresenta o melhor suspense de todos os tempos


"Pavoroso, intrigantemente erótico e íntimo... este thriller assustador é um exercício eletrizante da arte do suspense!"

(Newsweek)


           No ano de 1991 um filme chamou a atenção do público e, principalmente, da crítica da época, por apresentar um vilão psicótico e carismático, cuja relação com uma agente do FBI foi, além de conturbada, bastante memorável. Muito mais do que um suspense de primeira linha, "O Silêncio dos Inocentes" (The Silence of the Lambs) se supera em relação aos outros filmes do gênero por sua profundidade , tornando-se, assim, uma obra de terror psicológico absolutamente indispensável do diretor Jonathan Demme (vencedor do Oscar de Melhor Diretor por esta obra).
         Baseado no livro homônimo de Thomas Harris (adaptado por Ted Tally, vencedor do Oscar por Melhor Roteiro Adaptado), "O Silêncio dos Inocentes" é um filme hipnotizante no qual todos os elementos são desenvolvidos de maneira a perturbar o espectador das formas mais sombrias e desconfortáveis. A história gira em torno da típica perseguição a um assassino em série, mas diferentemente das outras obras, que apelam para a exibição de sangue, vísceras e torturas na tentativa de conferir intensidade às suas tramas – e raramente conseguem –, o filme de Demme se destaca por sua sutileza e pela tensão sugestiva que provoca.
Os destaques, como todos já sabem, são Jodie Foster, como a agente Clarice Starling, em sua caçada desnorteada a Buffalo Bill (Ted Levine), um assassino evasivo, sádico e transtornado com sua sexualidade, e que mata mulheres "cheinhas" para esfolá-las, e Anthony Hopkins (de "Drácula de Bram Stoker"), como o famoso canibal Hannibal Lecter, outro assassino perigosíssimo, preso no manicômio de Baltimore, em estado de isolamento máximo. Além de assassino, o Dr. Hannibal Lecter é um psiquiatra brilhante, capaz de se "infiltrar" na mente das pessoas simplesmente para se satisfazer à custa do sofrimento psicológico causado por sua influência. Hopkins ficou perfeito no papel desse vilão transtornado, transmitindo com fluência sua psicótica loucura existencial e seu poder de manipular as pessoas de formas aparentemente simples, mas cheias de genialidade. Isso é perceptível, por exemplo, nas cenas em que ele pressiona Starling a falar dos traumas de sua infância: morte do pai, relação com o restante da família e decisão de entrar para o FBI.
          Ademais, o filme é conduzido com um clima denso que prende a atenção com uma estrutura complexa e, ao mesmo tempo, direta e crua. Não há cenas de violência explícita, mas o horror fica por conta da sugestão. As vítimas de Buffalo não são mostradas durante o esfolamento, apenas por meio de closes rápidos ou fotografias; a tortura é extremamente psicológica, como vemos ocorrer com a filha da senadora durante boa parte do filme. Demme acerta também ao apostar em cenários escuros com a finalidade de provocar um desconforto claustrofóbico e consegue esse efeito em várias partes do filme: dos corredores sombrios do manicômio onde Hannibal está até o “covil” de Buffalo Bill.
A tensão do longa chega ao ápice quando Starling encontra o assassino e o persegue pelos corredores escuros (verdadeiro labirinto) da casa dele, uma cena que certamente entrou para a história do cinema como uma das mais eletrizantes e assustadoras, justamente porque se dá às escuras, de modo que tanto a personagem quanto o espectador estão desnorteados, e o perigo pode estar em qualquer lugar onde menos se espera.
         As borboletas, enfim, usadas como símbolos e marca registrada do assassino, passam perfeitamente a sensação desagradável de referência à morte nesse contexto, pois são deixadas nos cadáveres das vítimas como uma assinatura pessoal e pista para a “transformação” que Buffalo Bill almeja; transformação essa que choca quando descobrimos seu plano.
Ao fim da projeção, é fácil notar por que "O Silêncio dos Inocentes" é um filme de inúmeros méritos, felizmente reconhecidos pela Academia, que o premiou com os cinco Oscars mais cobiçados de 1991: Melhor Filme, Melhor Ator (Hopkins), Melhor Atriz (Foster), Melhor Roteiro Adaptado (Tally) e, claro, Melhor Diretor (Demme). Trata-se de um filme no qual a soma de fatores técnicos e cinematográficos em geral compõem uma trama imperdível a todos os amantes do bom cinema de suspense.





Conceito: Excelente
Nota: 10,0



segunda-feira, 4 de junho de 2012

Crítica: Cidade dos Anjos

                                                                                                                                                         


Brad Silberling apresenta  um clássico romântico sensível e sóbrio

          Atualmente, o cinema e a literatura têm abordado todo tipo de fantasia e clichês sobrenaturais. O motivo? Fazer dinheiro fácil à custa de histórias vazias, abrilhantadas somente pela presença do clássico elemento sobrenatural... Nesse sentido, vemos vampiros sofrendo crises existenciais, anjos misteriosos que sofrem por não poder amar "a mocinha", dragões disfarçados e por aí vai...
          Uma rara exceção nesse cenário quase totalmente comercial é o filme "Cidade dos Anjos" (City of Angels), de Brad Silberling. Totalmente sensível, mas sem os clichês comuns ao gênero romance, o filme de Silberling é uma recriação do clássico "Asas do Desejo" (1987), do alemão Wim Wenders. Note-se que "Cidade dos Anjos" é uma "recriação", não exatamente uma "refilmagem", como muitos apontam. A obra de Silberling tem elementos próprios e particulares que fazem deste um dos melhores filmes românticos americanos de todos os tempos.
          O filme narra a história de Seth (Nicolas Cage, de "Motoqueiro Fantasma"), um anjo que vaga pelo planeta aliviando as perdas das pessoas e consolando-as. Naturalmente, sendo um anjo, ele é invisível aos mortais e suas únicas companhias são outros anjos que cumprem a mesma missão de ajudar as pessoas. Os anjos do longa não são representados de forma estereotipada, tocando harpa, loiros, com auréolas ou asas. Em vez disso, eles são sóbrios, se vestem de preto e gostam de ler e de assistir ao pôr do sol na praia. Esta representação poética é muito bem interpretada por Cage, cujo personagem se apaixona perdidamente por Maggie (Meg Ryan). Depois de perder um paciente, a competente Dra. Maggie sofre um choque brusco; ela fica abalada e é nesse meio tempo que Seth começa a prestar atenção nela. Daí, nasce um amor irresistível entre eles. Maggie é uma das poucas pessoas que conseguem enxergar Seth, mas aí vem a parte dramática do filme: sendo anjo, Seth não pode se relacionar com Maggie (pelo menos não sexualmente, já que ele não pode sentir o prazer do toque em sua totalidade). Por não ter os cinco sentidos humanos (olfato, tato, audição, paladar e visão) Seth pede que Maggie descreva as sensações passadas por esses sentidos. As descrições dela estão também entre os momentos mais sensíveis e poéticos do filme. Maggie fica encantada e confusa com Seth, uma vez que ele só pode ter com ela uma relação que transcenda o desejo sexual; o próprio amor que ele sente por ela não é carnal, mas "divino", ou seja, além da percepção humana. Entretanto, percebe-se, mesmo nesse amor transcendental certas conotações sexuais subliminares.Outro empecilho é a incredulidade de Maggie, que não se convence totalmente da divindade de Seth.
         A despeito desses fatores, Seth também deseja ter uma vida humana ao lado de Maggie, amá-la como um humano e, para isso, renuncia à sua imortalidade (outro momento poético), finalmente tornando-se um ser humano normal.
          Contudo, a maior poesia do filme está no final, trágico e arrebatador ao mesmo tempo. Seth pode sentir a humanidade em toda a sua grandeza de sensações, mas também a fragilidade da vida, tão limitada ao destino frágil e incerto. Sozinho, ele redescobre por conta própria o valor da vida.
          Para finalizar,  é preciso citar a ótima trilha sonora, com músicas sensíveis e que traduzem toda a sutileza de tão belo filme. Outro aspecto interessante é a época em que o filme foi lançado: 1998, ou seja, bem antes da invasão dos fenômenos adolescentes virais que rondam por aí hoje em dia. "Cidade dos Anjos" também não faz apelação à beleza dos atores, pois tanto Cage quanto Ryan são atores maduros que se destacam por suas interpretações cuidadosamente dosadas no bom senso, o que faz do filme um cult romântico adulto, sem exageros nem clichês superficiais e batidos.          



   


Conceito: Ótimo
Nota: 9,0